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terça-feira, 10 de janeiro de 2017

OUTLETS: UM NEGÓCIO TODO ESPECIAL

Depois de uma experiência frustrada nos anos 90, os outlets encontraram sucesso no mercado brasileiro nos últimos anos. Alguns dos principais empreendedores nacionais querem garantir que o ciclo de expansão continue por muito tempo
Por Renato Müller*
 

Nos últimos anos, o desenvolvimento do setor de shopping centers, na esteira de uma década de contínua expansão da economia, abriu oportunidades para o ressurgimento de um tipo de empreendimento muito popular no varejo americano, mas que no Brasil era visto, após uma malsucedida experiência nos anos 90, com muitas reservas. Os outlets inaugurados no país nesta década mostram, porém, que com um varejo mais maduro esse modelo de shopping center assume um papel importante para empreendedores, lojistas e consumidores.

Desde 2009, alguns dos principais empreendedores do país inauguraram sete outlets em diversas regiões. “Em cada nova operação, aprendemos um pouco mais”, comenta Alexandre Dias, CEO da General Shopping Brasil, que opera quatro Outlet Premium no mercado nacional (São Paulo, Brasília, Salvador e Rio de Janeiro) e foi a pioneira da nova fase do setor. “O brasileiro gosta de outlets, tanto que compra muito quando vai aos Estados Unidos, mas mesmo assim o conceito foi visto com reservas quando começamos, no fim da década passada”, lembra. Isso se deu em grande parte pela experiência ruim dos anos 90, em que, empolgados pela estabilidade econômica pós-Plano Real, alguns empreendedores apostaram em shoppings mais espartanos que funcionariam como ponta de estoque das marcas. Por diversas razões, o conceito não emplacou.

No final da década passada, o maior amadurecimento do varejo brasileiro, com várias redes com pelo menos 50 lojas (o que permitia que houvesse saldo a ser vendido nos outlets), um cenário mais favorável na concessão de crédito para investimentos e um projeto estudado para que tivesse viabilidade financeira em sua construção, concepção e operação deram vida ao Outlet Premium SP, localizado na Rodovia dos Bandeirantes, entre São Paulo e Campinas. “Temos dois parques temáticos na vizinhança, funcionando como pontos de referência, e desenvolvemos o empreendimento de tal modo que o custo de condomínio chega a ser 70% inferior ao de um shopping tradicional. Isso permite reduzir o preço dos produtos e cria uma proposta de valor que atrai os clientes”, comenta Dias.

Uma característica peculiar do mercado brasileiro de outlets é que sua operação é mais complexa que a de seus similares americanos. “Talvez os outlets brasileiros sejam os que enfrentam mais restrições”, analisa Dias. “Por causa do histórico do setor no Brasil, não vendemos produtos com defeito e precisamos ter uma diferença de preço maior que nos outlets americanos e europeus. Para exorcizar a impressão deixada nos anos 90, fomos mais rigorosos”, afirma.

O rigor tem compensado: quando a Nike inaugurou sua loja no pioneiro Outlet Premium SP, as filas eram constantes. O empreendimento se mostrou vencedor desde o início, tendo sido inclusive premiado pelo International Council of Shopping Centers (ICSC) em 2011 como o melhor projeto latino-americano e um dos três melhores do mundo. O empreendimento está em expansão e neste fim de ano inaugura um deck park com 2 mil vagas de estacionamento e recebe uma série de novas marcas. Ainda hoje as marcas que chegam causam impacto: neste ano, a Burberry do Outlet Premium SP figurou, logo após a inauguração, entre as três melhores do mundo em faturamento.

A parceria com o varejo, por sinal, é um fator essencial para os outlets brasileiros. “Nossa expansão é feita a quatro mãos com os lojistas e até mesmo a escolha das praças para o desenvolvimento do outlet é feita com base naquilo que o varejo precisa”, afirma o executivo. Faz sentido, uma vez que os outlets têm como base o escoamento de produtos de coleções anteriores de marcas desejadas, a preços acessíveis. “Sem boas marcas e sem volume de produto, nenhum outlet é sustentável. É por isso que estamos sempre alinhados com os lojistas em nossas ações”, conta Dias. “Desde o nosso primeiro outlet, as marcas internacionais têm dado muita credibilidade aos empreendimentos. Lacoste, Nike, Adidas, Calvin Klein e outras varejistas já acostumadas a esse modelo de negócios no exterior foram fundamentais para a viabilidade do projeto e serviram como parâmetro para lojistas nacionais que não sabiam operar nesse conceito”, comenta.

Um fator que contribuiu para a rápida aceitação do modelo de outlets no Brasil foi a realização de descontos reais. “Infelizmente, o varejo brasileiro ainda conta com muitas promoções do tipo ‘a metade do dobro’. Quando os consumidores perceberam que valia a pena encarar meia hora de estrada para ir a um outlet e obter ganhos reais, o sucesso veio rápido”, teoriza. “O lojista também percebeu que teria ganho de escala e, para isso, foi muito importante termos uma forte parceria com marcas internacionais, que operam nesse modelo no exterior e nos ajudaram a mostrar a lojistas menos experientes que justamente o preço baixo é que trazia público. Com isso, a proposta de valor foi mantida e os resultados apareceram”, explica.

Os bons números do Outlet Premium SP levaram a General Shopping Brasil a abrir, em 2012, um empreendimento similar em Alexânia (GO), nas imediações de Brasília. Em 2013, o grupo Iguatemi abriu o I Fashion Outlet em Novo Hamburgo (RS), enquanto a General Shopping chegava a Camaçari (BA) com o Outlet Premium Salvador. No ano seguinte, a JHSF aumentaria a concorrência no estado de São Paulo com o Catarina Fashion Outlet, em São Roque (SP). “Vimos que havia uma demanda reprimida por esse tipo de empreendimento, pelo crescente hábito dos brasileiros de buscar melhores preços em produtos de qualidade, e também pela expansão das marcas de varejo no país”, afirma Robert Bruce Harley, diretor-presidente da unidade de Shopping Centers da JHSF.

Com um crescimento da ordem de 40% nas vendas em relação a 2015 e cerca de 2 milhões de visitantes (20% de expansão anual), o Catarina Fashion Outlet mostrou que as premissas da empresa estavam corretas. Já em outubro de 2015, com um ano de vida, o empreendimento recebeu sua primeira expansão. Atualmente com 105 lojas em uma área bruta locável de 24,1 mil metros quadrados, o outlet já tem sua segunda expansão em desenvolvimento. “Teremos mais 25 lojas em 4,5 mil metros quadrados de ABL, o que aumentará a atratividade do outlet e reforçará nosso compromisso de fazermos do Catarina o melhor empreendimento do gênero no país”, conta o executivo.
 
Novas vocações
Localizados a cerca de 60 quilômetros de grandes cidades, os outlets têm apostado na oferta de produtos de qualidade, de marcas reconhecidas, a preços acessíveis, para motivar os consumidores a viajar e visitar os empreendimentos. Em Salvador (BA), porém, o Outlet Premium local tem investido em uma nova frente para atrair os clientes: o turismo de negócios e lazer. Situado na rodovia que liga a capital baiana ao litoral norte, o outlet percebeu que poderia se beneficiar do fluxo de turistas que circulam na região.

Parcerias com os hotéis levaram ao desenvolvimento de postos de atendimento ao cliente, que fazem o traslado dos turistas para o shopping e de volta para o hotel. No Outlet Premium, o Desk de Turismo é uma central de atendimento que oferece o apoio necessário aos visitantes. Além de informações sobre a região, o local fornece dicas sobre as lojas do empreendimento e comercializa produtos de ONGs de artesanato da região, permitindo que os turistas levem para casa lembranças da Bahia. A administração do shopping realiza uma curadoria dos itens apresentados no Desk de Turismo, exibindo itens exclusivos e estimulando o artesanato local.

Para atender o turista de negócios, que frequenta o litoral norte baiano por causa dos congressos e feiras que ocorrem na região, o Outlet Premium Salvador desenvolveu a Arena Premium, uma estrutura de 4 milhões de reais com capacidade para receber até 5,6 mil pessoas em um ambiente climatizado e que é usada pelos hotéis da região para a realização de eventos de maior porte, que não cabem nas salas de convenções dos empreendimentos locais. Está nos planos do Outlet Premium fechar parcerias com operadoras de turismo, para que o cliente, ao iniciar sua viagem, já tenha o outlet como uma de suas paradas. Isso aumentará o fluxo de público e as vendas do shopping.

A vocação turística é o que está levando os grupos Tacla e Iguatemi a investir em outlets no estado de Santa Catarina. O trecho da BR-101 entre Florianópolis e Balneário Camboriú (duas cidades entre as dez melhores em qualidade de vida no país) deverá receber, no ano que vem, dois novos empreendimentos, levando para a região marcas nacionais e internacionais de prestígio.

O Porto Belo Outlet Premium, da Tacla, espera receber cerca de 400 mil clientes por mês e deverá ser entregue aos lojistas no segundo trimestre de 2017. Com 25 mil metros quadrados de área bruta locável em sua primeira fase, o empreendimento contará com 120 lojas em um terreno de 200 mil metros quadrados com 1,6 mil vagas para automóveis. Já no segundo semestre, a cidade de Tijucas (SC) receberá o I Fashion Outlet SC, segundo outlet da Iguatemi Empresa de Shopping Centers (que conta com um empreendimento do gênero em Novo Hamburgo/RS). Com 87 lojas e investimento de cerca de 150 milhões de reais, o outlet tem mais de 50% de suas lojas comercializadas. Para o vice-presidente de operações da empresa, Charles Krell, a concorrência próxima (o outlet da Tacla ficará a 16 quilômetros de distância) não atrapalha. Muito pelo contrário. “A concorrência é positiva porque aumenta a oferta de produtos e serviços e cria um polo. Las Vegas, por exemplo, tem quatro ou cinco outlets, e um complementa o outro”, afirma.
 
Setor em expansão
A Iguatemi tem os outlets como um de seus focos de expansão nos próximos anos. Em 2018, está prevista a inauguração de um empreendimento em São José dos Pinhais (PR), seguindo o mesmo padrão dos empreendimentos de Novo Hamburgo (RS) e de Tijucas (SC). Com potencial para até 60 mil metros quadrados de área bruta locável, o outlet paranaense terá primeiramente metade dessa área, distribuída em lojas de 200 a 800 metros quadrados. “Estamos investindo num empreendimento que oferecerá conveniência, mix diferenciado, preços atrativos o ano todo, além de um ambiente bonito e confortável, para que os clientes tenham uma ótima experiência de compra”, afirma Krell. O grupo Iguatemi não descarta construir, posteriormente, um hotel e um power center no mesmo terreno, dependendo da evolução das vendas e da demanda do mercado.

No ano seguinte, está prevista a inauguração de outro empreendimento do gênero, em Nova Lima (MG). Com os três novos outlets em operação, a previsão é que essa divisão do negócio represente até 10% das receitas do grupo, que conta hoje com 17 shopping centers em operação no país.

A pioneira General Shopping Brasil também desenvolve planos para a expansão de sua rede de outlets no país. “Temos projetos para outros quatro Outlet Premiums, que pretendemos abrir até 2018”, afirma Alexandre Dias. As localizações desses empreendimentos ainda não foram divulgadas. “Anunciaremos somente quando tivermos os projetos mais desenvolvidos. Já definimos onde os outlets estarão e iremos dobrar nossa presença de mercado nos próximos anos”, diz.
Segundo o executivo, o potencial de consumo não é o único nem o principal fator a ser levado em conta na expansão dos outlets. “O modelo não é uma questão somente de potencial de consumo: ele passa, obrigatoriamente, pelo potencial de crescimento das marcas. O consumidor pode até ter a renda e o interesse em comprar em um outlet, mas, se o varejista não tiver uma marca consolidada e a possibilidade de escoar seu estoque nessas lojas, o empreendimento não se sustenta”, analisa. “Por isso, nosso plano de expansão é muito criterioso e estamos ouvindo os lojistas até mesmo para definir a localização dos terrenos”, completa.
 
Por que agora os outlets vingaram?
Na primeira metade dos anos 90, com a perda de poder da população na esteira de um ambiente de inflação alta, ganharam espaço propostas baseadas em valor, como os outlets. No Brasil, porém, eles se apresentaram, naquele momento, com um conceito diferente do original americano: em vez de operações de escoamento de parte da produção (normalmente o saldo de coleções passadas), os empreendimentos se tornaram sinônimos de estruturas pouco complexas, muitas vezes temporárias, de lojistas independentes, sem apelo de marca e sem uma proposta de valor consistente. Implementados em galpões industriais adaptados, os outlets tiveram vida curta: até o fim da década, os oito empreendimentos inaugurados fechariam ou se reinventariam como shoppings tradicionais.

Nos anos seguintes, os consumidores passaram a ter acesso a produtos de melhor qualidade e demonstraram preferir ambientes mais sofisticados, nos quais pudessem ter uma experiência de consumo mais prazerosa. As sucessivas crises internacionais do final dos anos 90 e início dos anos 2000 provocaram grande turbulência e tornaram o mercado de outlets ainda mais arriscado. Ao mesmo tempo, os shopping centers tradicionais cresciam e prosperavam, dando ainda menos razões para a inauguração de outlets nos anos 2000.

No fim da década passada, o desenvolvimento do mercado eliminou as principais barreiras que tinham levado os outlets ao fracasso nos anos 90. Já existiam redes nacionais com mais de 50 lojas, levando à necessidade de canais específicos para a venda de mercadorias de coleções anteriores. Além disso, a chamada “década de ouro” do varejo trouxe dezenas de varejistas internacionais para o país, tornando o ambiente varejista local mais sofisticado. Com o desenvolvimento de projetos localizados fora das cidades (e longe da concorrência com shoppings tradicionais), vendendo produtos de marcas famosas, sem defeito, em empreendimentos concebidos para reduzir os custos de ocupação, o modelo de outlets conseguiu se viabilizar no Brasil nos últimos anos.
 
A nova onda dos outlets no Brasil
Inaugurados
2009 – Outlet Premium São Paulo – Itupeva/SP
2012 – Outlet Premium Brasília – Alexânia/GO
2013 – I Fashion Outlet Novo Hamburgo – Novo Hamburgo/RS
2013 – Outlet Premium Salvador – Camaçari/BA
2014 – Catarina Fashion Outlet Shopping – São Roque/SP
2014 – Off Outlet Fashion Fortaleza – Caucaia/CE
2015 – Outlet Premium Rio de Janeiro – Duque de Caxias/RJ
 
Previstos
2017 – I Fashion Outlet – Tijucas/SC
2017 – Porto Belo Outlet Premium – Porto Belo/SC
2018 – I Fashion Outlet – São José dos Pinhais/PR
2019 – I Fashion Outlet – Nova Lima/MG

Fonte: Matéria publicada na revista Shopping Centers, da Abrasce

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