Primeira marca global de roupas do Brasil vê um futuro com licenciamento além da moda e expansão da divisão internacional, sem perder de vista as raízes brasileiras.
Por Karina Souza
“Os ‘próximos 25 anos’ da Farm podem acontecer em três”, diz Marcello Bastos, co-fundador da marca, ao EXAME IN. A afirmação vem logo depois de ser questionado sobre o sentimento de a empresa comemorar um quarto de século e o que seria feito daqui para frente, de olho nas próximas duas décadas e meia. Os planos citados pelo executivo fazem jus à resposta, no fim das contas. Nos próximos três anos, a Farm, primeira marca brasileira a se tornar global, vai estender ainda mais os limites de onde chegou. Licenciamento de marca, novas regiões e um potencial ainda gigante a ser explorado no Brasil fazem o ‘combo’ do que promete ser o futuro da empresa. Ao menos até 2025.
Do lado brasileiro da operação, a marca tem hoje 90 lojas e deve fechar 2022 com R$ 1,2 bilhão em receita (numa conta leva em consideração a manutenção do patamar de crescimento do primeiro semestre deste ano comparado ao mesmo período do ano passado). Caso realmente chegue a essa cifra, a Farm vai superar as estimativas que tinha sobre o próprio faturamento em 2022 – de R$ 1 bilhão. Com a Farm Global nessa conta, o número pode chegar a R$ 1,7 bilhão, considerando que a estimativa dos R$ 500 milhões anunciada em 2021 de fato se confirme. Mas já vamos chegar ao lado “mundo” da marca mais adiante.
Em terras tupiniquins, a Farm planeja abrir mais 15 lojas no ano que vem, sendo sete na zona norte do Rio de Janeiro, um movimento inédito na capital carioca. É algo até de certa forma ‘atrasado’, dado o tempo em que está presente na cidade, e que deve ser replicado para outras regiões ao longo do tempo.
“Hoje, no Brasil, a nossa percepção é a de conseguir crescer na medida em que a gente quiser. Podemos abrir 15 lojas, 20, quantas forem necessárias. Esse número de 2023 deve se tornar muito maior ao longo dos próximos três anos”, diz Bastos.
É um patamar em que a companhia chegou com muito esforço e capacidade de se adaptar às mudanças do mercado. Uma delas é o olhar para o social, principalmente desde 2016, data em que Taciana Abreu (hoje head de ESG do Grupo Soma) entrou na Farm. A preocupação, no fim das contas, sempre foi fazer algo consciente do que a empresa era capaz de entregar, um passo de cada vez. Algumas conquistas já apareceram: hoje, metade do quadro de vendas da marca é formado por colaboradores pretos, por exemplo — um cenário totalmente diferente do que era a empresa em 2006.
Da porta para fora, esses critérios também são considerados na oferta de produtos e nos movimentos de expansão da marca. A inclusão do tamanho GG, por exemplo (de novo, um passo pequeno, mas cuidadoso) é um exemplo disso. Ao realizar todos os estudos para fazer com que a modelagem permanecesse a mesma com este tamanho a mais, a empresa primeiro disponibilizou esse tamanho para 7% da coleção, percentual que rapidamente passou para 28%, depois 56% e hoje está em 87%. Em relação à expansão geográfica da marca, esse movimento está muito mais relacionado a levar a oferta de produtos para regiões antes não consideradas prioritárias, como o interior, por exemplo.
O plano de expansão da Farm é uma notícia já anunciada há algum tempo. Há cerca de dois anos, a empresa contratou uma consultoria (na época, tinha 70 lojas abertas no país) para estudar qual seria o melhor caminho para a expansão. Na época, ouviram dos consultores que a marca poderia ter 150 lojas no país. Foram ajustando a rota e, passo a passo, abriram 25 nos últimos 24 meses. Agora, ao revisitar o estudo (com 90 lojas), a conclusão é a de que a empresa tem a oportunidade de abrir mais 100 no futuro.
Para colocar os avanços em números: em 2019, a marca faturou R$ 630,2 milhões, cifra que teve queda com a pandemia (foi para R$ 614,4 milhões) e explodiu no ano passado, com R$ 898,4 milhões em receita anual. Isso só considerando a divisão nacional.
Licenciamento: estampas da Farm em tudo?
Uma outra rota, já planejada para explorar a popularidade da Farm daqui para frente, foi anunciada no Investor Day do Grupo Soma neste ano e reforçada na fala do executivo durante a entrevista: a oportunidade de licenciamento. As collabs (produtos feitos em parceria com outras marcas, como a coleção com a Tok&Stok, por exemplo) foram um bom primeiro passo para a empresa chegar ao patamar almejado.
A estamparia da Farm, ao longo do tempo, se transformou em um case global. Fácil de ser identificada, mesmo ao olhar menos atento. Para manter tudo isso funcionando, a estrutura interna de profissionais que trabalham com estampas tem o mesmo número de profissionais (cerca de quarenta pessoas) do que o time de estilo.
“A gente foi procurado por uma empresa dos Estados Unidos que tem uma filial no Rio e que nos disse ‘vocês têm muito dinheiro na mesa’. Dá para explorar a estética das estampas em todo o tipo de produto. Aliás, foi esse o principal fator do nosso sucesso quase imediato nos Estados Unidos. O que a gente quer é ir para uma indústria que pode ter a marca ou não, que vamos entender a qualidade do produto e liberar para a empresa fazer o que ela quiser. Por exemplo, imagine uma empresa de eletrodomésticos que vai usar a nossa estampa em 20 itens, isso seria só o começo. Aí, entramos em um novo modelo de remuneração, com royalties”, explica Bastos.
O objetivo é fazer de três a quatro licenciamentos anuais e que façam sentido para a Farm. A ideia é que, à medida que a marca de roupas abre mais lojas, o conhecimento de marca ajude ainda mais as outras marcas a terem sucesso nos licenciamentos.
Um primeiro passo importante já foi dado nesse sentido. A empresa, recentemente, foi convidada pela Starbucks Ásia e Oceania (região onde ainda nem está presente com as roupas) para desenvolver uma coleção de 15 itens. Hoje, os produtos não vêm para o Brasil, mas estão disponíveis em países como a Malásia, Austrália, Nova Zelândia e Japão.
Farm Global
No último ano, a Farm Global faturou US$ 50 milhões e, em 2022, com a entrada em novas regiões, esse número deve crescer ainda mais. O primeiro país selecionado para receber a marca foi os Estados Unidos e, agora, a empresa está abrindo as portas na Europa. Daqui para frente, a expansão para outras regiões está nos planos da Farm. América Latina, Oriente Médio e cidades do leste europeu, por exemplo, estão nessa rota.
Para continuar crescendo nesses locais – especialmente nas regiões mais próximas ao Brasil –, a Farm vai passar a ter novas lojas geridas por parceiros locais, num esquema similar ao de franquias. A diferença é que os profissionais selecionados para geri-las serão selecionados com foco em experiência no mercado de atacado.
A Ásia ainda não está nos planos, ao menos por enquanto. A sensação é que há muito trabalho a fazer antes de chegar lá. “A gente fez um estudo gigantesco com uma grande consultoria internacional e já foi possível ver que somos uma marca com alto reconhecimento nos Estados Unidos e que deve seguir o mesmo caminho na Europa. Tem todo esse plano montado, mas ainda é gigantesco para executar. A gente acabou de abrir a segunda loja na Europa. É cedo para pensar na Ásia, porque será outro projeto grande e que vai demandar esforço para saber qual é a estratégia correta para entrar lá”, diz Bastos.
Nos Estados Unidos, operação mais “madura” fora do Brasil, os efeitos de fazer um passo de cada vez mostram os resultados. Hoje, a companhia fatura US$ 5 milhões por mês com o e-commerce local, o que a torna, em reais, a segunda maior dentro do Grupo Soma, atrás somente da operação nacional da marca. A rápida adesão dos consumidores, por um mix de esforços de comunicação e de ter as peças usadas por famosas como Sarah Jessica Parker e Anne Hathaway (com awareness espontâneo da marca), já faz com que o e-commerce funcione como um mapa de calor de regiões mais atrativas para abrir lojas físicas. A próxima a ser inaugurada nos EUA dentro dessa estratégia será aberta no Texas.
Tudo isso para tornar a marca cada vez mais conhecida e fortalecer cada vez mais o posicionamento da Farm Global. Hoje, para lembrar, a divisão já tem um valor percebido maior do que o da operação brasileira (a diferença fica de R$ 1.100, considerando a conversão, para R$ 200 por aqui) e tem margens melhores também.
Os fatores, somados, tornam a Farm um case global e reforçam a tese de ser uma das principais empresas responsáveis pelo crescimento do Grupo Soma ao longo dos próximos anos. No limite, em cinco anos, a divisão internacional pode se tornar maior do que a própria empresa-mãe. “Vai depender só da nossa capacidade de investimento e crescimento da estrutura”, diz Bastos.
É uma trajetória e tanto para a marca. No aniversário de 25 anos, o que a Farm mostra é que o apetite para crescer é tão vasto quanto a quantidade de estampas que produz. As primeiras duas décadas e meia foram só o começo.
Fonte: Exame
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